Retrato do Dr. Boucard by Tamara de Lempicka - 1929 - - coleção privada Retrato do Dr. Boucard by Tamara de Lempicka - 1929 - - coleção privada

Retrato do Dr. Boucard

óleo sobre tela • -
  • Tamara de Lempicka - May 16, 1898 - March 18, 1980 Tamara de Lempicka 1929

Nunca uma carreira dedicada à luta contra a diarreia foi retratada de modo tão glamoroso. O quadro de Tamara de Lempicka mostra o Dr. Pierre Boucard, o bacteriólogo francês que isolou a Lactobacillus acidophilus das fezes humanas, desenvolvendo o Lactitol, um medicamento contra a enfermidade, ainda hoje largamente empregue em França e outros sítios. A sua firma, Laboratoire du Lactéol du Docteur Boucard, nos arredores de Paris, foi altamente lucrativa. A riqueza que daqui resultou para Boucard permitiu-lhe deleitar-se na sua paixão pela arte e levar uma vida de lazer. Foi amigo do fotógrafo Jacques Henri Lartigue, que lhe tirava instantâneas ocasionais, bebendo coquetéis ou ao volante do seu Rolls Royce. Em finais dos anos 20, Boucard tornou-se mecenas de Lempicka, fazendo encomendas de retratos da sua família e recusando o trabalho de outrem. A imagem aqui presente data de 1929. O negócio veio transformar radicalmente as finanças de Lempicka. Nascida em Varsóvia em 1892 no seio duma família aristocrática polaco-russa (ou talvez em Moscovo em 1898 ou 1902—sempre foi vaga acerca da sua idade e local de nascença), Lempicka fugiu da Rússia com o seu esposo czarista após a revolução, quando o seu estilo de vida faustoso começou a atrair as atenções da Cheka, a polícia secreta. O casal chegou a Paris em 1918, tirando Tamara lições de pintura enquanto o marido não conseguia encontrar trabalho. Por alturas de 1925, já se encontrava estabelecida enquanto pintora renomada de arte déco. O mecenato de Boucard possibilitou-lhe a aquisição de um estúdio ostensivo em vidro e crómio. O retrato que Lempicka pintou do médico apresenta uma ambiguidade subtil. Este aparenta elegância e sofisticação, com o charme de uma estrela de cinema. Temos um homem cosmopolita e um cientista famoso, posando numa meia-volta dinâmica com os seus aparatos profissionais. A dualidade na personalidade de Boucard é impecavelmente sugerida pela roupa que veste, pintada em linhas escorreitas, como que laminares: à primeira vista, poderá parecer que usa uma modesta bata de laboratório, mas esta é na verdade uma gabardine branca, mais adequada a um encontro nos Campos Elísios que a uma investigação médica. A cena fica completa com a iluminação teatral e o fundo dramático de planos arquitetónicos abstratos emprestado do Cubismo.